domingo, 21 de agosto de 2011

Luz, câmera, sertão

Fui fazer uma viagem,
lá pra bandas do nordeste.
Participar de uma filmagem:
"Um iânqui cabra da peste".

Depois de desembarcar,
fui parar no Cariri.
E o diretor já questionou:
"Are you from daqui?".

Eu disse que não, meu senhor,
sou do Rio de Janeiro.
Mas no meio do sertão,
carioca é estrangeiro.

Faltou água, faltou luz;
só não faltou calor.
A produção faliu, 'cabou.
Nem buscaram o diretor.

E o cara dos state
no início até chiou.
Mas não deu dez minutos,
logo se apaixonou ...

Mister William Goldenstein,
foi namorar Mariazinha,
filha de um pobre capataz,
e irmã do Zé Sardinha.

O pior é que deram certo,
e Mariazinha foi ouvindo.
E de tanto escutar,
quis gritar o seu destino.

Largou pai, largou irmão,
e largou o marido gringo.
Trabalhou, juntou milão,
e disse: Tchau, que já vou indo.

Ela fez as suas malas,
juntou trapo e dicionário.
Depois de aprender inglês
foi treinar o vocabulário.

E quem diria que Mariazinha,
filha de Joana dos açúdes,
ia pegar avião
e chegar em Hollywood.

Conheceu uns produtores
e vendeu o seu roteiro.
Convenceu os domadores
a investir um bom dinheiro.

E 'zinha mudou de nome,
pra melhor se aproximar
do sotaque lá dos home,
Jane Lee passou chamar.

Fez o filme e no elenco
só tinha artista bom.
Só estrela de calibre
pra chamar a atenção.

E o filme estreou
e fez o maior sucesso.
Jane Lee barbarizou
e sua obra fez progresso.

Ganhou prêmio e fez fortuna.
E ficou reconhecida.
Sua mesa ficou farta,
esqueceu da outra vida.

Mas o ouro na estante
não reluz no coração.
E Jane Lee quis ser Maria
e voltar para o sertão.

Quando anunciou a partida
os estúdios emburraram.
Reclamara da saída e diziam
que os contratos não deixavam.

Mas 'zinha nem ligou
e pegou o seu avião.
Mas a vida traz surpresas;
às vezes boas; ás vezes, não.

O avião explodiu no ar,
caiu no mar, matou Maria.
Fez o mundo do cinema chorar
e L.A. decretou luto de um dia.

Os produtores (após enxugar as lágrimas)
fizeram roteiro da vida dela.
Pobre Maria, nem o corpo acharam no mar,
já estava incorporada por outra nas telas.

O filme ficou pronto e era o dia da première.
Com os ingressos todos vendidos
para o filme da tal mulher.

Estavam todos bem vestidos
e tudo se apagou.
O nordeste foi escolhido
como palco deste show.

O projetor iluminou
a grande alvura do telão.
E devolveu, por uma noite,
Mariazinha pro Sertão.

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