sábado, 11 de abril de 2009

Eu quero

Me abraça.
Me beija.
Me faz.
Me enlaça.
Me queira.
Me desfaz.
Me agarra.
Me constrói.
Me corrói.
Me destrata.
Me afaga.
Me afoga.
Me aflige.
Me sustém.
Me seduz.
Me induz.
Me reluz.
Me enobrece.
Me aquece.
Me molha.
Me enlouquece.
Me desconcerta.
Me aperta.
Me acerta.
Me farreia.
Me nomeia.
Me acelera.
Me purifica.
Me justifica.
Me come.
Me bebe.
Me chame.
Me enlame.
Me lava.
Me seca.
Me peca.
Me morde.
Me sacode.
Me equilibra.
Me canta.
Me conheça.
Me pela.
Me apela.
Me revela.
Me veste.
Me despe.
Me reveste.
Me deita.
Me deleita.
Me entorta.
Me ajeita.
Me cama.
Me clama.
Me ama.

Me abraça.
Me beija.
Me faz.
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Como vestibulando sei que não se deve usar pronome oblíquo em início de frase.
Não faça isso em casa (ou em redações do vestibular).

17h08

17h
João Carlos termina o seu expediente.
Sai correndo. Roubaram-lhe o carro e João Carlos não tinha seguro. João Carlos vai pegar um ônibus.
O ônibus passa às 17h08 em ponto. Se ele perder esse ônibus, o próximo vem cheio e ainda demora o dobro do tempo para chegar até sua casa.
17h07
João Carlos dá graças. Ainda há tempo. Um minuto antes.
Nem sempre ele consegue. Mas, hoje ele desviou de dúvidas e happy hour. Hoje ele precisa chegar em casa até as 18h15.
17h08
O ônibus não passou.
17h09
O ônibus não passou.
17h10
João Carlos começa a ficar nervoso.
Tenta imaginar o que pode ter acontecido.
Desiste de esperar.
17h11
João faz as contas e acha que dá uma hora indo a pé do ponto do trabalho até sua casa.
Ele sai. Sempre olhando pra trás na esperança do ônibus ainda aparecer.
17h14
Vira numa rua de onde não poderá mais acompanhar o esperado ônibus.
Segue seu caminho. Passo apressado.
17h26
João Carlos pára na frente de uma loja. Pensa por três segundos. Entra.
17h29
João Carlos sai da loja com um pacote embrulhado.
João Carlos segue seu caminho.
17h33
João Carlos aperta o passo.
17h42
Já são trinta minutos andando.
João Carlos sua.
17h50
João Carlos corre.
17h58
Faltam dois quarteirões.
Há esperança.
18h05
Um quarteirão.
18h13
João abre o portão. Passa pelo porteiro sem cumprimentá-lo.
O elevador está no 17º. João Carlos vai de escadas.
Um.
Dois.
Três.
Quatro.
Cinco.
Seis.
Sete.
Oito. Oitavo andar.
18h15
João abre a porta.
Está tudo escuro. João espera ouvir algum som.
Mas, não se ouve nem mesmo um único suspiro.
É possível que, por alguns segundos, João Carlos não tenha nem respirado.
João Carlos sentou no sofá e chorou.
Pobre João Carlos.
49 anos. Funcionário público há 23. Trabalha como professor de história. Ele tem adorado ficar sem carro. Passar a semana com essa emoção de pegar o ônibus exatamente às 17h08.
Na verdade, essa tem sido sua única emoção.
João Carlos não tem muitos amigos. Talvez, nenhum.
Mas, não temos tempo para falar de sua vida.
Voltemos às 18h15 do fatídico dia.
Hoje é aniversário de João Carlos.
Ninguém foi. Ninguém ligou. Ninguém lembrou.
João Carlos às vezes se pergunta se não é ele um fantasma.
João Carlos põe o pacote embrulhado, comprado um pouco mais cedo, num quarto. Nesse quarto, vemos dezenas de pacotes embrulhados. Uns já amarelados.
06h00
João acorda.
Vai trabalhar e esperar o ônibus das 17h08.