segunda-feira, 16 de março de 2009

Devoluções

Depois da onda de contos nos blogs dos meus amigos, resolvi entrar na dança.
Fica aqui o meu primeiro conto: Devoluções.
Espero que gostem!
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Fui buscar na sua casa o livro que você tinha pegado emprestado, mas agora eu precisava devolvê-lo.
No dia anterior tínhamos nos divertido tanto. Havia sido mais um dia feliz, onde dois apaixonados faziam juras de amor eterno.
Quando cheguei na sua casa, você abriu o portão, trocamos um beijo e me mandou entrar. Pediu que eu me sentasse e me olhou. Só aquele olhar já bastava. Mas eu fiquei e esperei as palavras saírem da sua boca: Acho melhor a gente terminar.
Eu sabia. - disse - Assim que eu sentei e você me olhou, eu sabia o que viria.
Levantei. Você me deu o livro. E me levou até o portão.
Depois disso, não fui capaz de dizer mais nenhuma palavra.
Me virei e fui andando. Logo parei, voltei e bati em seu portão. Meus olhos cheios de lágrimas, a voz embargada perguntei porque havia me beijado. Você não respondeu. Se desculpou e fechou o portão.
Fui embora, tomado pelo susto.
Não entendia.
Me perguntava, porquê? O que levou ela a isso?
Eu não tinha respostas.
Não consegui ir para casa. Fui para casa do Matheus, um grande amigo. Toquei o interfone e me mandou subir. Quando me viu me perguntou o que tinha acontecido. Ela terminou. Disse isso e fiquei lá parado. Coitado, rs, ele tentou dizer alguma coisa, mas estava saindo para o trabalho. Me deixou as chaves e pediu que eu ficasse à vontade.
Deus, como aquele dia foi difícil!
Te ligava e você não atendia o celular.
Pensei em tantas coisas, mas nada parecia responder as minhas perguntas.
Procurava minhas falhas, onde eu poderia ter errado, mas não encontrava modos de me culpar... Nós éramos tão felizes. Nunca tinha encontrado uma pessoa que eu pudesse ter prazer em todos os sentidos. As pequenas coisas que fazíamos juntos eram tão mágicas. Melhor que dormir com você era acordar com você. Sol ou chuva, o dia nascia por nós dois.

Depois desse dia eu não te vi mais.
Nos primeiros dias achava que você ia me ligar e iríamos apenas rir de tudo o que havia acontecido. Mas você não ligou.
O tempo passava. Eu procurava o seu perfume pela rua. Onde eu ia, meu olhar te buscava na multidão.
Passava perto dos lugares que costumávamos ir, e nada.
Fui ficando com medo de te encontrar e você estar com um outro homem. Mas, o desejo de te reencontrar talvez valesse a pena desse sofrimento.

Hoje acordei pensando em você. Já fazia um tempo que você não surgia dentro de mim com tanta intensidade. Oito anos. Oito longos anos sem saber onde você está.
Mas, o dia estava apenas começando. As surpresas ainda estavam por vir.
Leandro ligou e me pediu o livro que tinha me emprestado.

O livro!
Onde estava o livro? Anos que eu não o via. Mas, sabia exatamente onde ele estava. Foi só por um segundo, e logo lembranças enterradas voltaram do mundo dos mortos com num filme de terror.

Pedi que ele esperasse até o outro dia, e, claro, me desculpei pelo tempo. rs Não é qualquer um que espera quase nove anos por um livro...
Cheguei em casa e fui até a sexta gaveta do armário da esquerda que fica no meu quarto. Escondido o suficiente para não esbarrar nele, mas perto o bastante para manter as memórias.
Abri-o pela primeira vez desde que o tinha te emprestado. Assim que o peguei e folheei caiu um pedaço de papel. Uma folha dobrada. Uma surpresa. A surpresa que havia mencionado antes.
Me abaixei. Peguei a folha e comecei a ler. As lágrimas voltaram a cair por você. Não acreditei e li de novo, agora em voz alta, para ter certeza de que esse momento era real:


"Querido Luciano,
não é fácil para mim escrever esta carta. Mas, espero que assim que você a leia possa entender o porque resolvi terminar o nosso relacionamento.
Reencontrei uma pessoa que foi muito importante para mim. Ele havia me abandonado. Mas, eu sabia que se um dia ele voltasse, eu seria dele no mesmo momento.
Quando o vi, resisti. Mas, nos encontramos de novo e de novo e vi que não podíamos te enganar por mais tempo.
Quem diria que você. O primeiro homem que amei depois dele, me faria amá-lo de volta mais intensamente do que antes?
Você não merece isso. Eu sei. Você foi muito especial. Mas, ele é a minha vida.
Tenho certeza que você irá encontrar alguém que te faça o bem que mereces.
Beijos e os melhores desejos.
Fernanda e Matheus."

Era demais para mim crer nas palavras escritas naquela carta. Tentei me lembrar. Mas, porque ele não me disse nada? Nem havia ligado o distanciamento do Matheus com o dela. Naqueles primeiros anos eu havia me isolado tanto. Perdi o contato com tantos amigos que a falta dele não foi percebida por muito tempo até agora.


O amigo que me deu abrigo num dia difícil, na verdade levava aquela que sempre foi dele. Doía tanto pensar que você nunca foi minha.
Não sei se fui cego, se não percebi que vocês já se conheciam ou se trocavam olhares durante nossos encontros.

Não sei se o melhor teria sido nunca ter te conhecido ... Talvez sim ... Talvez não ...
Mas, tenho certeza de que não me arrependo. Pelo menos eu sempre fui sincero com os meus sentimentos.

...

Eu queria apenas o livro.
Apenas devolver a um amigo o que a ele pertencia.