Ponteiro. Ponteiro. Ponteiro.
O dia passa o dia inteiro.
Nunca para de passar.
Ponteiro. Ponteiro. Ponteiro.
Eu já sei que é quase janeiro.
E eu nem vi o ano começar.
Ponteiro. Ponteiro. Ponteiro.
Qual das partes desfaz o inteiro?
Qual o todo quer fragmentar?
Ponteiro. Ponteiro. Ponteiro.
Acabou o tempo e o dinheiro.
Ouço o décimo segundo badalar.
E cadê você?
O sol nasceu, cadê?
Onde está? E de onde voltas?
Te falei, não vá na rua,
não saia às voltas com essa gente,
com essa gente, com esse cara.
Cadê você?
Oi? Não to escutando.
O sinal tá fraco.
To fraco. Não li os sinais.
Aliás, onde eu estou?
Não to achando. Não to achando.
Não, to procurando. Cadê?
Já tá chegando?
Ah, menos mal.
Então deixo a porta aberta.
Sim, está destrancada.
Ah, isso não faz mal.
Aqui a rua é tranquila.
Não tenho medo que invadam.
Tenho medo é que debandem.
Oi? Cadê você?
Já é quase meio dia.
Meio dia. Meio dia.
Já almocei. Cadê você?
Teve trânsito? Ah, acidente.
Mas sem feridos graves.
Não teria tanta certeza.
Ah, com certeza.
A porta tá aberta.
É meio dia. Não tem perigo.
Ah, tá com um amigo?
Que amigo? Há, saiu contigo.
E porque volta contigo? Ah, é teu amigo.
É essa gente. É esse cara.
Com certeza.
Oi? Tá onde? Parou pra almoçar?
Mas eu fiz comida.
Ah, tava vazia a barriga.
Eu entendo. Eu entendo.
Compreendo.
Esquenta na hora da janta.
De que adianta?
Não se pode burlar a fome.
Seja homem. Não reclame.
Passou a fome? Claro, o almoço foi ótimo.
Ah, que bom. Que bom.
Já tá chegando? Ah, que bom.
Cuidado que logo anoitece.
Sabe como é, olha o perigo.
Ah, é. Seu amigo. Que bom.
Que bom.
Cadê você? É quase o fim do dia.
É quase janeiro. Chegou maio.
Feliz natal de novo? Cadê você?
Ué, você e seu amigo? Mais que amigo?
Ué, não vi perigo. Ah, mas sem feridos?
Eu não teria tanta certeza.
Foi há pouco que começou?
Entendo. Fragmentou. Acabou.
Acabou. Acabou. Logo anoitece.
Passe bem.
Passa o dia inteiro.
Passa o tempo, o ponteiro.
Ponteiro. Ponteiro. Ponteiro.
domingo, 29 de dezembro de 2013
sábado, 21 de dezembro de 2013
Pega ladrão
Fui roubado.
Os lábios por outros intocados
já não são mais apenas meus.
Sim, eu sei, os sábios
me preveniram.
Disseram que os que riram
logo aprenderiam a chorar.
Fui roubado.
E como culpar o ladrão?
Não há vítima e não há pecado.
Não sei se foi planejado,
mas perfeito foi o culpado
que antes do crime
já tinha absolvição.
Fui roubado.
Foi feita justiça,
nenhum ano de perdão.
Quando a boca não é postiça
o beijo é confissão.
Os lábios por outros intocados
já não são mais apenas meus.
Sim, eu sei, os sábios
me preveniram.
Disseram que os que riram
logo aprenderiam a chorar.
Fui roubado.
E como culpar o ladrão?
Não há vítima e não há pecado.
Não sei se foi planejado,
mas perfeito foi o culpado
que antes do crime
já tinha absolvição.
Fui roubado.
Foi feita justiça,
nenhum ano de perdão.
Quando a boca não é postiça
o beijo é confissão.
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sexta-feira, 13 de dezembro de 2013
Canção quase póstuma
Se você deseja que eu morra
por favor, não discorra o modus operandi.
Aperte logo o gatilho, atire um punhal,
ou me jogue na frente de um bonde.
Tanto faz, tanto fez o como,
o quando e o onde.
Se o meu corpo é teu alvo,
mire bem com a tua mira.
Na cabeça o tiro é certo,
mas não tão fatal se é na barriga.
Na perna eu caio e me quebro,
no braço eu entorto, no peito eu sangro.
Tanto faz, tanto fez a marcha,
o choro e o tango.
Mas ouça bem
essa última canção.
Só não me mate de amor
que aí eu morro do coração.
por favor, não discorra o modus operandi.
Aperte logo o gatilho, atire um punhal,
ou me jogue na frente de um bonde.
Tanto faz, tanto fez o como,
o quando e o onde.
Se o meu corpo é teu alvo,
mire bem com a tua mira.
Na cabeça o tiro é certo,
mas não tão fatal se é na barriga.
Na perna eu caio e me quebro,
no braço eu entorto, no peito eu sangro.
Tanto faz, tanto fez a marcha,
o choro e o tango.
Mas ouça bem
essa última canção.
Só não me mate de amor
que aí eu morro do coração.
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segunda-feira, 2 de dezembro de 2013
Virginal
Pobre virgem.
Não rompeu-se ao mundo,
não sangrou, não sentiu.
Pobre ilha inabitada.
Não sentiu o peso do homem,
não sofreu devastação.
Pobre corpo intocado.
Não sentiu o peso do homem,
não sangrou, não sofreu.
Não rompeu-se ao mundo,
não sangrou, não sentiu.
Pobre ilha inabitada.
Não sentiu o peso do homem,
não sofreu devastação.
Pobre corpo intocado.
Não sentiu o peso do homem,
não sangrou, não sofreu.
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sexta-feira, 25 de outubro de 2013
Dica da caça, dia do pescador
Pescador que é esperto
joga queijo pra ratazana.
Isca arisca só petisca quem bobo é.
Alçapão de caça certa
é minhoca no anzol.
Ouvido aberto,
se não olvido a toada,
é rato afogado ou
girino com intolerância à lactose.
Afinal, o que a isca confisca?
História de pescador...
joga queijo pra ratazana.
Isca arisca só petisca quem bobo é.
Alçapão de caça certa
é minhoca no anzol.
Ouvido aberto,
se não olvido a toada,
é rato afogado ou
girino com intolerância à lactose.
Afinal, o que a isca confisca?
História de pescador...
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segunda-feira, 16 de setembro de 2013
Dea deitada vendo o filme
Dea deitada vendo o filme.
O tempo passa.
No filme o homem viaja no tempo.
Dea viaja vendo o filme.
Com o tempo o sono passa.
Dea deitada vendo o tempo.
O filme passa.
No filme o homem viaja no tempo.
Dea viaja vendo o filme.
Com o tempo o filme passa.
Dea deitada vendo o homem.
O sono passa.
Na vida o tempo passa o homem.
Dea acorda.
Acabou o filme.
O tempo passa.
No filme o homem viaja no tempo.
Dea viaja vendo o filme.
Com o tempo o sono passa.
Dea deitada vendo o tempo.
O filme passa.
No filme o homem viaja no tempo.
Dea viaja vendo o filme.
Com o tempo o filme passa.
Dea deitada vendo o homem.
O sono passa.
Na vida o tempo passa o homem.
Dea acorda.
Acabou o filme.
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terça-feira, 27 de agosto de 2013
Sou, em um ato
A arte pulsa e jorra da fonte do desejo.
Meu complexo de édipo se amamenta da coxia.
Os três sinais são anjos anunciadores.
Meu pai é o som que vem da platéia.
Eu sou um movimento e uma palavra,
sou um corpo e um sentimento,
sou tantos que nem me aguento
de estar apenas um.
A arte pulsa e jorra desejo da minha fronte.
Caem as máscaras.
Visto as que convém.
Quem me chama pelo nome
esquece que estou muito além.
Eu sou um movimento e uma palavra,
sou texto, imagem e som.
Sou um corpo e um sentimento,
sou do palco e este é meu dom.
A arte pulsa e jorra do meu corpo.
O palco é meu desejo.
A coxia meu unguento.
Sou ator, cria de dores;
sou ator, banco de amores;
sou ator, irmão dos atores.
Meu complexo de édipo se amamenta da coxia.
Os três sinais são anjos anunciadores.
Meu pai é o som que vem da platéia.
Eu sou um movimento e uma palavra,
sou um corpo e um sentimento,
sou tantos que nem me aguento
de estar apenas um.
A arte pulsa e jorra desejo da minha fronte.
Caem as máscaras.
Visto as que convém.
Quem me chama pelo nome
esquece que estou muito além.
Eu sou um movimento e uma palavra,
sou texto, imagem e som.
Sou um corpo e um sentimento,
sou do palco e este é meu dom.
A arte pulsa e jorra do meu corpo.
O palco é meu desejo.
A coxia meu unguento.
Sou ator, cria de dores;
sou ator, banco de amores;
sou ator, irmão dos atores.
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sábado, 24 de agosto de 2013
Narcolepsia programada
São despertos os infantes
de seus sonhos imorais?
Se espertos os infantes
não despertam nunca mais.
de seus sonhos imorais?
Se espertos os infantes
não despertam nunca mais.
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sexta-feira, 2 de agosto de 2013
De que adianta ser poeta
Falo, escrevo, rimo.
O verbo e o verso eu muito primo,
mas nem só de poema vive o homem.
Talvez com as palavras eu me esquivo
do que é preciso ser mais cativo:
a ação.
Ora, de que adianta ser poeta
se na hora que o espeto espeta
não é poesia e sim o passo a frente
que faz o corpo deixar de estar rente
à dor, ao sangue e à cicatriz?
Ora, que é preciso mover o corpo.
Usar as mãos além do esforço
de criar sobre o papel.
É preciso estar vivo fora do verso.
O poeta já é réu confesso
mas sua escrita não pode ser prisão.
Pois então eu me liberto.
O caderno continua aberto,
pronto para eu escrever.
Mas pronto eu também me ponho
transformando em ação o sonho,
transformando o verso em viver.
O verbo e o verso eu muito primo,
mas nem só de poema vive o homem.
Talvez com as palavras eu me esquivo
do que é preciso ser mais cativo:
a ação.
Ora, de que adianta ser poeta
se na hora que o espeto espeta
não é poesia e sim o passo a frente
que faz o corpo deixar de estar rente
à dor, ao sangue e à cicatriz?
Ora, que é preciso mover o corpo.
Usar as mãos além do esforço
de criar sobre o papel.
É preciso estar vivo fora do verso.
O poeta já é réu confesso
mas sua escrita não pode ser prisão.
Pois então eu me liberto.
O caderno continua aberto,
pronto para eu escrever.
Mas pronto eu também me ponho
transformando em ação o sonho,
transformando o verso em viver.
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segunda-feira, 8 de julho de 2013
Semente regada; flora justiceira
Você dorme chorando.
Você acorda chorando.
Dói acordado.
Dói sonhando.
Você faz silêncio,
mas o grito ecoa por dentro.
Você fica distante,
mas sente falta do perto e do rente.
Plantou, colheu.
Frutos, flores ou espinhos.
Você acorda chorando.
Dói acordado.
Dói sonhando.
Você faz silêncio,
mas o grito ecoa por dentro.
Você fica distante,
mas sente falta do perto e do rente.
Plantou, colheu.
Frutos, flores ou espinhos.
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sábado, 1 de junho de 2013
(ré)gurg(ito)s
é pau é pedra é o fim do caminho. o método é este ou não o há? tudo fadado? tá certo? tá fechado? tá aberto? nada certo. tudo torto. doente. doente.
ainda somos os mesmos e vivemos. pra quê? não adianta viver como eles, como qualquer outro ou como o que nem ainda veio. tudo fadado? todo fodido.
ainda somos os mesmos e vivemos. pra quê? não adianta viver como eles, como qualquer outro ou como o que nem ainda veio. tudo fadado? todo fodido.
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quinta-feira, 16 de maio de 2013
Todo o planejamento
Eu gritei por socorro.
E ouvia a resposta:
não posso. não posso.
Eu gritei por ajuda.
E ouvia a resposta:
não dá. quem sabe depois.
Eu gritei por caridade.
E ouvia a resposta:
não tenho como.
Eu gritei por solidariedade.
E ouvia a resposta:
se esforce mais.
Eu gritei por clemência.
E ouvia a resposta:
isso é pedir muito pra mim.
Eu gritei por alguém.
Socorro! Socorro!
Uso a voz. Preciso da sua mão.
Eu vi as costas.
Eu gritei.
Não posso. Depois é demais pra mim.
Eu gritei. Eu gritei. Eu gritei.
Eu gritei por você.
E ouvi a resposta:
Desligado ou fora da área de cobertura.
E ouvia a resposta:
não posso. não posso.
Eu gritei por ajuda.
E ouvia a resposta:
não dá. quem sabe depois.
Eu gritei por caridade.
E ouvia a resposta:
não tenho como.
Eu gritei por solidariedade.
E ouvia a resposta:
se esforce mais.
Eu gritei por clemência.
E ouvia a resposta:
isso é pedir muito pra mim.
Eu gritei por alguém.
Socorro! Socorro!
Uso a voz. Preciso da sua mão.
Eu vi as costas.
Eu gritei.
Não posso. Depois é demais pra mim.
Eu gritei. Eu gritei. Eu gritei.
Eu gritei por você.
E ouvi a resposta:
Desligado ou fora da área de cobertura.
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terça-feira, 9 de abril de 2013
Diz o ditado
Diz o ditado: o bom filho a casa torna.
Mas todo aquele que retorna
é realmente bom?
Tanto tempo que não encontro.
Senti falta da página em branco,
da infinitude de palavras.
E chego sem estrondo
pois o tempo brando
por vezes carrega vis clavas.
Diz o ditado: água mole em pedra dura
tanto bate até que fura.
Mas
o que fora a pedra antes da enxurrada?
O que é o papel antes da poesia?
O que é a poesia antes do poeta?
Poeta bom é o que fura, é o que fora,
é o que fere ou o que finda?
Quando não há respostas ou ditados
eu torno à página em branco e
tanto escrevo até que fujo.
Mas todo aquele que retorna
é realmente bom?
Tanto tempo que não encontro.
Senti falta da página em branco,
da infinitude de palavras.
E chego sem estrondo
pois o tempo brando
por vezes carrega vis clavas.
Diz o ditado: água mole em pedra dura
tanto bate até que fura.
Mas
o que fora a pedra antes da enxurrada?
O que é o papel antes da poesia?
O que é a poesia antes do poeta?
Poeta bom é o que fura, é o que fora,
é o que fere ou o que finda?
Quando não há respostas ou ditados
eu torno à página em branco e
tanto escrevo até que fujo.
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sábado, 23 de fevereiro de 2013
Como estais?
Esgotado
Esvaído
Completamente consumido
Dragado
Moído
Convenientemente esquecido
Descartável
Postergado
Facilmente posto de lado
Olvidável
Ultrapassado
Categoricamente soterrado
Esvaído
Completamente consumido
Dragado
Moído
Convenientemente esquecido
Descartável
Postergado
Facilmente posto de lado
Olvidável
Ultrapassado
Categoricamente soterrado
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sábado, 19 de janeiro de 2013
Invasão de propriedade
Eu estava sozinho, calado,
protegido da fúria e do calor
que só o amor carrega.
Você veio e feito tributo
jogou o meu silencioso viver
às garras e presas de uma nova cor.
Minha vida tão bege já não é mais uniforme.
Possuo agora novos edros;
não caibo mais na velha casca.
Não pense em correr.
Você invadiu o meu tédio.
Já não há retorno para o velho eu.
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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013
Chegar no lugar que é lar
Corri, suei, cheguei.
Lutei contra o trânsito, contra o tempo,
contra os contratempos.
Cheguei.
E onde estás?
Deparo-me com as portas fechadas.
Trancadas.
Cadeados e alarmes.
Não me queres.
Vou.
Corro, suo, chego.
A casa não é mais a mesma.
Está aberto, escancarado,
sem cacos de vidro no muro.
Mas você não está aqui.
Corro, suo, fujo.
Não quero lugar que não seja lar.
Não quero ilha nem muralha.
Quero o metro quadrado que habitas.
E onde é isso?
Diz que eu vou correndo,
sem medo do suor,
sem olhar pras horas.
Diz que eu chego,
se é lá que você está.
Lutei contra o trânsito, contra o tempo,
contra os contratempos.
Cheguei.
E onde estás?
Deparo-me com as portas fechadas.
Trancadas.
Cadeados e alarmes.
Não me queres.
Vou.
Corro, suo, chego.
A casa não é mais a mesma.
Está aberto, escancarado,
sem cacos de vidro no muro.
Mas você não está aqui.
Corro, suo, fujo.
Não quero lugar que não seja lar.
Não quero ilha nem muralha.
Quero o metro quadrado que habitas.
E onde é isso?
Diz que eu vou correndo,
sem medo do suor,
sem olhar pras horas.
Diz que eu chego,
se é lá que você está.
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