Posto seu trabalho aqui como um meio de divulgação de sua arte e também como incentivo para que ele crie o seu portal.
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Cotidiano
Inicia-se mais um dia e todas as suas tradições. A tentativa de abrir os olhos, em um primeiro momento, é em vão. Levantar-me, por conseguinte, é entender as forças físicas atuando sobre o corpo. O silêncio inunda o recinto. E lá se vão os minutos.
Torna-se um grande pesar o lento passar das horas, toque após toque, falsidade após falsidade, realidade após realidade... E os minutos se vão.
Chega o momento, então, que envolve toda uma expectativa implícita dentro de mim. Fronte cansada e ao mesmo tempo amarrada, dia interminável, problemas, ligações, compromissos, metas... E, de repente, um (lindo) sorriso aparece no centro dessa multidão, roubando toda a cena.
Sorriso de um ser poético, mágico. Em sua face, traz nariz bem modelado, longos cílios, sobrancelha cheia e muito bem delimitada, pequena curva no queixo... Seus cabelos e suas unhas são concomitante e (por que não?) previamente combinadas com suas roupas de estilo. Meu estilo, devo afirmar. Seus olhos são como o céu: inexplicavelmente profundos, grandiosos (nunca grandes, embora ela esteja certa disso) e sinal claro da existência divina. Além disso, têm a força de me despedaçar, sem grande esforço.
Quando, porém, o riso se esvai, meus olhos, enfim, se fixam nos seus (pois o contrário tem alta parcela de improbabilidade). Estatizam-se. Enquanto observo um tom desconhecido de castanho claro penetrar meu olhar singelo e normal, o sorriso retorna, contido, pouco a pouco. As palavras do ambiente voam pelos ares. Passam, tocam as paredes, ressoam, encontram outras pessoas; mas a mim, em nada afeta. Ah quisera eu ouvir algo ou distrair meu olhar! Algo me algema, em cárcere privado. O melhor dos castigos. Ouço, enfim, uma palavra: a Guarda de cela quer ver como anda seu prisioneiro. "Tudo bem?", pergunta. "Claro...", respondo. Mas de um diálogo tão banal, surge o ápice do dia: seu toque. Eis que agora estou sentenciado à prisão perpétua. Impressionantemente, os minutos não se vão. E todas as minhas angústias, tristezas e tribulações dissipam-se.
Neste momento, sinto os tais sinos que outrora eram introduzidos à minha mente como sinal de um nobre sentimento. E, mesmo sem muito nexo ou analogia aparente, recordo claramente de minha avó exortando-me, quando criança: "Quem com ferro fere, com ferro será ferido...". Tomo, pois, a liberdade de parodiar o provérbio, reaproveitando-o ao meu contexto atual: "Quem com ferro fere, por Ferrol será ferido...". Direto no coração. Se bem que não firo nem a uma formiga...
Não a estou amando, embora acredite não ser isso muito difícil.
Não a desejo, pois compreendo tal palavra com certo anseio.
E nada peço, dia após dia, senão:
Vida, permita-me contemplá-la mais uma vez amanhã.
(O tempo parou.)